O amor está nos gestos, não nas palavras

10:49:00

Corredor de uma UTI. Aparelhos bipando, profissionais correndo apressados de um lado pro outro, ambiente gelado e pouco receptivo. Talvez o corredor mais longo da minha vida. Tentei em vão insistir pra que eles me deixassem entrar acompanhada de alguém, mas foram inflexíveis: entre sozinha ou aguarde lá fora. Caminhei em silêncio, nervosa, triste. E enquanto eu caminhava, cenas de um filme iam passando na minha cabeça. Numa daquelas camas ao fundo estava aquela que me carregou por 9 meses em seu ventre, aquela que me ensinou a pronunciar as primeira palavras, a que me ensinou a comer baguinhos de feijão num pratinho de alumínio, aquela que foi orgulhosa buscar meu primeiro boletim na escola, aquela que me esperou chorosa na sala de espera da cirurgia do joelho, aquela que me ligou chorando dizendo que eu tinha passado no vestibular, aquela que aplaudiu de pé as minhas conquistas, que me segurou em cada passo em falso que eu dei. E agora ela estava ali: olhos fechados, corpo imóvel, lábios sem batom, e aparelhos que a mantinham respirando. Minha mãezinha, aquela que sempre me recebia com um abraço, que fazia a melhor maionese do mundo, que me escrevia cartões em todos os meus aniversários, estava ali agora, sem conseguir sequer abrir os olhos. Os dias se arrastavam, as notícias boas não chegavam e a angústia só crescia. Mas, depois de uma longa tempestade, vieram os primeiros raios de sol, e sim, ela recuperou a saúde e nós tivemos a alegria de tê-la em nosso meio novamente. Depois daquela 14 de fevereiro nada mais nas nossas vidas foi igual. A dor, a angústia, a tristeza e as lutas foram dando espaço a esperança, a alegria, a união, a fé. O tamanho da dor foi proporcional ao tamanho do aprendizado. Depois daqueles dias sombrios eu aprendi as maiores lições da minha vida. Aprendi que a vida é frágil demais e que ela pode ser tirada de nós a qualquer momento. Aprendi a valorizar cada dia com as pessoas que amamos. Aprendi que a gente não deve perder tempo com coisas mesquinhas e pequenas. Aprendi que a nossa família será sempre o nosso amparo nos momentos de dor. Aprendi que as tempestades vem para nos ensinar a remar, e não para nos afundar. E aprendi que desespero é falta de fé. Sim, a tempestade passou, nossa mãezinha continua cozinhando feijão no fogão a lenha pra mim, continua fazendo bolinho de chuva recheado, continua dobrando os joelhos e rezando pela nossa família, continua me escrevendo cartinhas em todos os meus aniversários. E eu continuo a falar com ela por telefone todos os dias, a não sair de casa sem abraça-la e beijá-la, a escrever cartinhas no dia das mães, a insistir pra que ela cuide mais de si, a ouvir as suas histórias, a acalmá-la nos dias de ansiedade, a pedir a benção antes de dormir, a escrever cartazes da igreja pra ela, a ajudá-la a fazer os almoços de domingo. É muito pouco, eu sei, mas é assim que eu aprendi a dizer que a amo. É assim que eu falo todos os dias do quanto sou grata a Deus por tê-la conosco. É assim que eu demonstro que o quanto sou grata por ser sua filha. E é assim que eu valorizo a graça de ter uma mãe presente, amorosa, cuidadosa, carinhosa e acolhedora. E é assim que eu aprendo a cada dia que o amor está nos gestos, não nas palavras.

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"Sou menina levada, princesa de rua, sou criança crescida com contas para pagar. E mesmo pequena, não deixo de crescer. Trabalho igual gente grande, fico séria, traço metas. Mas quando chega a hora do recreio, aí vou eu...
Beijo escondido, faço bico, faço manha, tomo sorvete no pote, choro quando dói, choro quando não dói. Quer me entender? Não precisa."


Fernanda Mello

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