A partida não foi naquele dia...

07:52:00


Você pode até não ter percebido, mas ele já tinha partido muito antes daquele dia. Antes dele ter coragem pra dizer que não queria mais, antes mesmo de você desconfiar de que algo estava errado... Ele já havia partido. Partiu naquele dia que você preparou cuidadosamente aquele jantar e ele ficou o tempo inteiro no celular, ou distraído olhando pra TV. Partiu nas conversas reticentes, nos convites negados, nos planos adiados. Naquela noite que o plano era saírem pra jantar e depois cineminha, mas ligou na última hora dizendo que estava cansado e precisava dormir cedo. Você não notou, mas os pensamentos dele não moravam mais ali. Buscava explicações para o inexplicável: "deve ser estresse", "amanhã ele estará melhor", "talvez a culpa seja minha". Não, não era sua. Ele partiu porque quis partir, mesmo você tendo feitos todos os esforços para mantê-lo ali. E você assistiu cada momento da sua partida, sentiu os abraços com pouca intensidade, os beijos às pressas, as palavras vazias, os silêncios perturbadores e a frieza dos jantares à dois. Esfriou a comida, esfriaram os beijos, esfriou o que parecia que arderia para sempre. Ele partiu e não há nada que você possa fazer, a não ser deixá-lo ir. Manter vivo aquilo que já se foi é prolongar sofrimento desnecessário. Deixe que ele parta, que leve suas coisas na mala... Mas não permita que ao partir ele leve também o que é seu. Não deixe que leve seu bom humor, sua alegria, sua vontade de viver e principalmente a sua esperança. A passagem dele pela sua vida foi de fato passageira, mas acredite, nem todos querem apenas passar por você. Doeu né? Foram noites sem sono, meio litro de lágrimas, ligações intermináveis para a melhor amiga, dias sem fome e sem vontade de sair da cama, medo da solidão, medo de não conseguir superar a dor da partida... Mas saiba que ele sequer olhou pra trás naquele dia que fechou a porta. E você ficou ali: imóvel, estática, aos prantos e sozinha. Fechou e abriu os olhos na esperança que fosse só um pesadelo. Não era. Abriu a porta pra ver se o carro ainda estava ali. Não mais. Correu pra pegar o celular na esperança que houvesse uma ligação dele arrependido. Não tinha. Ele se foi, mas você ficou. Deixe que ele vá. Comece arrumando a bagunça que ele deixou. Organize, limpe, ajeite, jogue fora. Pensando bem, seu guarda roupa vai até ficar mais espaçoso, você terá mais tempo para a sua família e seus amigos e até aquela viagem vai poder sair do papel. Não se prenda ao que já se foi. Quem perde tempo olhando pra porta que se fechou esquece de apreciar o por-do-sol da janela que se abriu.

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"Sou menina levada, princesa de rua, sou criança crescida com contas para pagar. E mesmo pequena, não deixo de crescer. Trabalho igual gente grande, fico séria, traço metas. Mas quando chega a hora do recreio, aí vou eu...
Beijo escondido, faço bico, faço manha, tomo sorvete no pote, choro quando dói, choro quando não dói. Quer me entender? Não precisa."


Fernanda Mello

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